Estudo da Unicamp usa células de pacientes com esquizofrenia para criar ‘minicerébro’ em laboratório e simular início da doença

Estudo da Unicamp usa células de pacientes com esquizofrenia para criar ‘minicerébro’ em laboratório e simular início da doença

Um estudo realizado no Laboratório de Neuroproteômica da Unicamp produziu, a partir de células da pele de pessoas com esquizofrenia, um modelo que representa o cerébro do paciente e simula o início do transtorno. Segundo os pesquisadores, o "minicérebro" pode ajudar no desenvolvimento de novos medicamentos e terapias para tratar a doença.

Para construir o modelo, as células da pele foram transformadas em células tronco, que têm a possibilidade de se transformar em qualquer tipo de célula. Em laboratório, elas foram manipuladas a se tornarem células nervosas.

 

“A gente coloca elas em uma configuração que elas começam a se desenvolver como um minicerébro mesmo”, explica Daniel Martins de Souza, professor de bioquímica da Unicamp e um dos autores do estudo. “É um cérebro primitivo feito em laboratório”.

 

Em parceria com o Instituto D’Or de Pesquisas (IDOR) e com as Universidades Federais de São Paulo (UNIFESP) e do Rio de Janeiro (UFRJ), os pesquisadores observaram o comportamento das células cerebrais.

 

“O bacana é que a gente tem um minicerébro de uma pessoa que tem a doença, pois estamos usando células com a genética de um paciente”.

 

Segundo Souza, o modelo é complexo o suficiente para representar o cerébro e simular o neurodesenvolvimento. Até então, para estudar a esquizofrenia era preciso adotar técnicas menos assertivas, já que não é possível obter amostras cerebrais de pacientes vivos.

“Dificulta muito modelar essa doença em animais, porque é uma doença mental-psicológica”, explica o biológo. “Quando muito, a gente consegue estudar um cerébro que foi coletado após a morte”.

Ao comparar o “minicerébro” de pacientes com esquizofrenia com o de pessoas mentalmente sadias, os pesquisadores constataram que pessoas que possuem o transtorno tem uma atividade celular menor.

 

“É como se a fábrica de proteínas, que são a máquina das celulas ali, trabalhassem mais devagar”, explica Souza.

 

Essa redução na quantidade de proteínas do sistema nervoso pode ser uma das marcas do início do transtorno. Por isso, o uso células tronco no estudo é extremamente importante, pois permite que os pesquisadores observem como os neurônios de pacientes se desenvolvem.

 

“A diferença na quantidade de energia não é algo especifíco da esquizofrenia, mas é definitivamente um componente dela. E a gente está mostrando que, desde o desenvolvimento das células nervosas, essa diminuição está acontecendo”, resume Souza.

Imagem de ressonância magnética de cérebro — Foto: GETTY IMAGES/BBC

Imagem de ressonância magnética de cérebro — Foto: GETTY IMAGES/BBC

 

Novos tratamentos

 

Os primeiros sintomas da esquizofrenia costumam aparecer em jovens adultos, quando o desenvolvimento cerebral está quase completo. Mas os pesquisadores acreditam que o transtorno se inicie muito antes, e o que foi observado nos "minicerébros" corrobora a tese de que a esquizofrenia é uma doença do neurodesenvolvimento.

“Existem estudos que mostram que pessoas que vem a desenvolver esquizofrenia já tinham sinais anos antes da doença”, afirma o pesquisador.

 

“Estima-se que um paciente com esquizofrenia já tem o cerébro se desenvolvendo de uma maneira diferente em útero ainda, enquanto ele é um feto na barriga da mãe”.

 

O "minicerébro" criado em laboratório na Unicamp também possibilita o surgimento de novos medicamentos, pois encurta o caminho da produção de remédios. Atualmente, a esquizofrenia é tratada com antipsicóticos que, conforme explica Souza, são bastante limitados.

 

“Eles só conseguem tratar a parte dos sintomas, tem diversos efeitos colaterais e, basicamente, não funcionam para metade dos pacientes”, afirma.

 

Para Souza, essa falta de eficácia dos medicamentos atuais para o tratamento dos pacientes faz com que seja necessário compreender melhor a biologia da esquizofrenia.

“Às vezes, não é nem uma questão da pessoa não ter acesso aos medicamentos, é a questão que os existentes não funcionam para a pessoa”, explica o pesquisador.

Além disso, o estudo abre caminhos para que, a longo prazo, possam ser encontradas formas de tratamento mais personalizadas ou, até mesmo, formas de reverter o quadro. “A gente pode testar, literalmente, infinitos números de compostos, diferentes condições, concentrações diferentes, um monte de coisa diferente”, completa.

 

Fonte: https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2022/12/17/estudo-da-unicamp-usa-celulas-de-pacientes-com-esquizofrenia-para-criar-minicerebro-em-laboratorio-e-simular-inicio-da-doenca.ghtml